segunda-feira, maio 21, 2007

Gestão da Produção de Talentos


Uma das mudanças paradigmáticas que está ocorrendo na economia mundial é o surgimento de um novo fator estratégico de produção: o talento.

Com a globalização e a abundância de capitais, o talento passou a ser fator estratégico para enfrentar a crescente competição. O talento, provisoriamente definido aqui como a capacidade de resolver problemas complexos de forma inédita, passou a ser fator mais escasso no mundo. Hoje, ter talento não significa deter o conhecimento na sua fronteira e aplicá-lo ou dar soluções aos problemas que sejam deduzíveis ou decorrentes do estado das artes do conhecimento. É preciso algo mais, criatividade, capacidade de ir contra a corrente, geração de novas idéias e percepção de novas oportunidades de aplicação do conhecimento e geração de soluções inéditas. É esse fator de produção que é escasso, bem remunerado e está gerando, no mercado de trabalho, a guerra não só nas indústrias "high-tech", consultorias e instituições financeiras, mas que se estende para os demais setores e as universidades.

Ao país que almeja acelerar o crescimento não basta priorizar gastos em educação, é necessário formular uma política apropriada de educação, reformando o sistema, em todos os seus níveis, respondendo aos desafios colocados pelo mercado de trabalho.


Uma pesquisa internacional conduzida pela Corporate Executive Board, com sede em Washington, constata que três quartos dos altos executivos de recursos humanos estabeleceram como prioridade número um das suas empresas "atrair e reter talentos". Mas a questão que quero tratar neste artigo é como as universidades e escolas devem reagir a este grande desafio colocado pelo mercado de trabalho. Obviamente, as universidades e as escolas nos EUA e na Europa, como em países como a China, estão investindo e se reestruturando para enfrentar estes desafios.


No Brasil, o debate e a reorientação das universidades nem se iniciou. Os desafios são múltiplos, mas menciono apenas dois. Primeiro, de natureza pedagógica: como formar talentos? Como recrutar alunos com potencial de talento? Como desenvolver novos métodos capazes de formar profissionais criativos e inovadores? Não basta desenvolver um sistema capaz de transmitir de forma repetitiva e mecânica o conhecimento; é necessária uma revolução. No mínimo precisamos formar e desenvolver no aluno, simultaneamente, capacitações em duas direções. Que a aprendizagem seja significativa, o conhecimento seja incorporado como parte da capacidade cognitiva própria e que o aluno tenha capacidade de processar informações eficientemente, de forma crítica, e de detectar oportunidades inovadoras. Que a aprendizagem não seja mecânica e por simples absorção, mas resulte de uma prática que desenvolva capacidade de descoberta por iniciativa própria. É preciso uma verdadeira revolução, pois o nosso ensino está calcado na aprendizagem mecânica e por recepção (do "conhecimento" para fazer as provas) e não no desenvolvimento dos instrumentos cognitivos do aluno, muito menos da sua criatividade. O segundo desafio que as universidades enfrentam é que, neste novo quadro, não basta desenvolver um sistema capaz de transmitir de forma repetitiva e mecânica o conhecimento. O sistema tem que ser um ambiente de aprendizagem favorável ao desenvolvimento de talentos e tal ambiente só é possível recrutando e retendo professores talentosos. Os modelos convencionais de produção repousam em dois mecanismos de coordenação da atividade produtiva: incentivos materiais e organização hierárquica. Supõe-se que estes dois mecanismos podem ser traduzidos em contratos que otimizam a produção, especificando as atividades e metas a serem alcançadas pelo produtor e sua remuneração. Mas quando se trata de produção científica, que envolve a geração de novo conhecimento - portanto, um ato de criação de algo novo -, é impossível especificar as atividades que envolvem a criatividade. Desta forma, a produção científica repousou sempre em outros modelos de gestão nos quais a promoção da cooperação foi sempre importante. Tanto os incentivos materiais como a hierarquia/comando/controle são importantes, mas têm seus limites e não geram sempre maior eficiência.


O desenvolvimento da nova tecnologia de informação, com a junção das tecnologias de telecomunicação e computação, gerou um novo mecanismo de coordenação da atividade produtiva que deverá impulsionar a produção de conhecimento e deverá trazer enormes ganhos na produção de talentos. O estudo da produção de softwares livres como o Linux ou a Wikipedia revelou que criação de redes de cooperação trouxe à tona alguns conceitos fundamentais para aumentar a eficiência da produção acadêmica. Em primeiro lugar, torna-se óbvio que os seres humanos e, particularmente, os cientistas não são movidos apenas por incentivos materiais e comando hierárquico, mas têm outras motivações emocionais e éticas. Constatou-se também que a grande maioria dos seres são "reciprocadores" morais e cooperam se os outros o fazem e se o ambiente for propício à cooperação. Os "free-riders" compulsivos ou dedicados são uma pequena minoria.


Com a ampliação da visão do ser humano como uma máquina emocional e não apenas máquina racional maximizadora, que responde a estímulos materiais ou à hierarquia, chegou-se a um novo modo de produzir baseado na cooperação, no qual os "reciprocadores" morais contribuem voluntariamente baseados na confiança. Esses novos conceitos são mais adequados quando o desafio é atrair e reter talentos e aumentar a sua produtividade. Esse novo modo de produzir traz ganhos importantes de eficiência. Em primeiro lugar, há ganhos de escala, como existe variabilidade de preferências e de competências específicas, quanto maior o número de cooperadores, maior a probabilidade de gerar soluções inéditas e solucionar problemas complexos. Segundo, há um ganho de informação, pois cada indivíduo conhece melhor as suas competências e em que tipo de tarefa pode contribuir mais. Da mesma forma, podemos ter ganhos na alocação. O novo mecanismo de coordenação é, obviamente, mais eficiente que o mercado ou a hierarquia.


No Brasil, o sistema de avaliação dos centros de pós-graduação na Capes foi um grande avanço e sem dúvida trouxe incremento à produção acadêmica e na competição entre os centros. No sistema da Capes há indicadores quantitativos como professor orientador por aluno, produção de teses e dissertações e, principalmente, produção científica, medida pelas publicações em revistas acadêmicas, com pontos maiores para aquelas de maior prestígio e dificuldade de aprovação. Tudo isto pode ser traduzido num contrato acoplado a incentivos materiais. Mas dado que as atividades criativas são impossíveis de serem especificadas num contrato e o ser humano é um "reciprocador" moral, os centros de produção acadêmica, envolvidos em produzir talentos e utilizar os professores com maior eficiência e produtividade, deverão incorporar esses novos conceitos apontados acima caso queiram se preparar para os desafios da nova economia.


(Yoshiaki Nakano, ex-secretário da Fazenda do governo Mário Covas (SP), professor e diretor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas - FGV/EESP, escreve mensalmente às terças-feiras.)


obs: Alguém aí ainda tem dúvida da importância da produção científica na NOSSA PROFISSÃO??

Muitos reclamam da bibliografia fraca, dos livros ultrapassados, da falta de informação. Mas poucos se preocupam em produzir, em pesquisar. É fato que só alcançaremos nosso verdadeiro valor perante a sociedade, quando despertarmos para estes fatores e irmos a luta!!! Quando não nos aquietarmos quando alguém publicar artigos dignos de "Marie Claire" e assinar como Secretária Executiva. Pensem nisso... Boa semana a todos!

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